domingo, 14 de dezembro de 2008

Repouso


Deixe dormir em paz
o que no passado ficou
que o presente 
se apresenta
com as cores
e sabores da amizade
que tambem alimenta.



Imagem: foto numa tarde chuvosa em Santa Teresa do Rio de Janeiro.

terça-feira, 18 de novembro de 2008

De vento em Pipa


Não se esquece quem é dono de qual lado da cama, mas é até perdoável, já que a arte de dormir junto é para poucos dois em um que às vezes se encontram por aí.É claro que a linha imaginária funciona muito bem para definir as regiões climáticas do planeta, mas não é muito eficiente para impor limites ou definir a temperatura do coração.

Dormir junto é permitir que essas linhas sejam cruzadas, que a pulsação e a respiração sejam conhecidas e se algo muda, alguém vai querer saber o por quê. Aquele que mudou pode responder, ou simplesmente não dizer nada e esse silêncio pode ser confortante ou irritante, dependendo do número de voltas que o pensamento tiver dado nesse círculo de amor. Ou os pés também podem se procurar no fim da cama, como um jeito de apaziguar até mesmo o que já é somente ternura. Depois o sono vem para silenciar ainda mais a quietude, deixando só o assobio do vento embalando os sonhos.

O que importa se os pensamentos às vezes se afastam para outros suspiros? Importa muito, porque os cabelos cheirosos como o cacho de caju daquela árvore lá da praia, esteve tantas vezes enrolados nos meus dedos e grudados na pele suada de amor, que é difícil imaginar outras mãos a afagá-los. Mesmo imaginando, é possível apostar que em outros cantos, o cheiro não é o mesmo . Em cada olfato um registro, uma memória. Ganhará a memória que não se findar?

O cajueiro ainda estava florido. Ainda há frutos para dar. Contudo nem as grandes falésias foram capazes de guardar seus pensamentos num só lugar. Grande ilusão seria, os cajus nem maduros estão...Mas no meio do azul, dividido entre céu e mar e um punhado de sol refletido no seu rosto sorrindo ao me olhar, dava até para acreditar que ao cair da noite, você haveria de se entregar. Eu só tinha a espera para lhe dar.

A sua entrega e a minha espera continuaram estáticas, talvez por um cansaço, talvez por medo, talvez por uma saudade. Então, como a lua minguante que vimos nascer, pego a estrada e vou sumindo devagarinho e aos poucos você nem vai se lembrar que eu disse que viveria um grande amor, desses que nos fazem mudar o prumo, mudar de rumo, porque quando os golfinhos não apareceram, deram o sinal de que esse amor só viveu de vento em Pipa.


Imagem: Soltando pipa
Ricardo S. R. Costa

sexta-feira, 3 de outubro de 2008

Boa noite


Eu agora vou com
a lua

Procurar em algum lugar
da rua

Qualquer lembranca
sua

imagem: Mulher e passaro ao luar - Joan Miro (1893-1983)



segunda-feira, 22 de setembro de 2008

Andarilhos no sertão

Andarilhos do sertão,
agora sobre rodas.
Não aquelas que carregam
carroças, trouxas e gentes,
mas as outras que nelas
se equilibram sonhadores.
Passa boiada, passa chão
a fina chuva que caiu
fez brotar o verde claro
dos pequizeiros que derramam
flores e beleza na terra,
terra seca do sertão.
Na esquina, numa encruzilhada
uma casa abandonada.
Mesmo com o bobo medo
de gente já morrida,
adentramos na casa que
um dia já teve vida.
Que surpresa linda
ao entrar e ver a marca de
um quadro negro na parede;
era uma escola do sertão
no meio da estrada,
no meio do nada.
Na volta da andança,
o sol esticava seus raios,
a terra brilhava dourada.
Gente simples que passava
acenava encantada
pelos andarilhos com roupas
coloridas, em cima de
suas carroças urbanas,
que precisam de pernas
para alcançar os sonhos.
E na vida, de sonhar
é a unica coisa que nao se cansa.


segunda-feira, 8 de setembro de 2008

Presente do Indicativo



Penso em você, é claro,
quando o frio bate
e a minha nuca, agora nua,
está longe das suas mãos,
que a aquecem e acendem
a paixão de ter você, enfim.

Penso no vazio que sinto
quando, por não me entender,
eu mesma o afasto e vejo
os lençóis desarrumados
marcando contornos do seu corpo,
que mora ali quando sou amorosa.

Penso nas cores que irradiam
da sua presença, nas flores
vermelhas dos meninos
de Liverpool, no verde da
samambaia, no furta-cor rítmico
cintilante, brilhante,
que exala da sua vocação
em tocar meu coração.

Penso em não soltar
as suas mãos que afagam
a minha dor, que se juntam
como se quisessem me dar
um pouco de ar para beber,
quando de noite o sono
tenta me golpear em alerta.

Penso na minha insistência
em permanecer imperfeita,
e no medo de, por estúpidas ilusões,
ter certeza do contrário e
acabar deixando escorrer,
esvair a única fonte do
verdadeiro amor que conheci
desde que a vida me deu você.



domingo, 7 de setembro de 2008

Meio Tom



As nuvens vão chegando
Abraçando as montanhas
A multidão caminhando
Cada qual com sua solidão

Pingos, frios, não se importam
Começam a cair fazendo os passos
Se apressarem entre os prédios
Arranha-montanhas e céus

O cinza descolore traços
Enquanto passos procuram marquises
A água cai, pesada vai
Molhando felizes e tristes

Mas em algum lugar da cidade
Ainda deve existir um jardim
Onde esteja chovendo na roseira...



Canção com Beto Lopes